Nove meses. Nove meses é o tempo
necessário para gerar um ser humano. Há bebês que nascem um pouco antes e casos
raros de outros preguiçosos que nascem uns diazinhos depois. Mas geralmente é
isso: nove meses. Nove meses de trabalho ardiloso do corpo materno, nove meses
de infinitas e incansáveis multiplicações celulares, nove meses da mais
maravilhosa alquimia corpórea de que somos capazes. Fato. Fato do qual eu
discordo plenamente.
Tem
gente que já nasce grávida. Lá pelos cinco anos de idade, nos dias de inverno,
eu deitava todas as minhas bonecas Barbie nas gavetas do meu armário para
aquecê-las entre as roupas dobradas. Já estava grávida, acredito. Grávida de
maternidade. Não digo vocação para
maternidade, digo gravidez mesmo. Minha biologia já me programava para cuidados
futuros e certeiros.
Anos
depois tive uma zique-zira, uma repentina e incontrolável vontade de arrumar a
casa. Doei um terço dos meus apegos materiais e queimei o outro. Comprei uma
lata de tinta e pintei, sozinha, as paredes do quarto. Alguns meses depois eu (achei
que) começava a pensar em ter outro filho. Mas se fosse observada por biólogos
para um programa do Discovery Channel, eles certamente já cantariam a pedra no
meu primeiro dia de arrumação doméstica. “A
fêmea atingiu sua maturidade gestacional e começa a arrumar o ninho. A época de
concepção se aproxima.”
Outro
dia fui encontrar meu marido num happy hour e levei meus dois filhotes debaixo
do braço. Sentei de frente para uma moça casada e sem filhos, que discursava
muito animada sobre assuntos profissionais. Enquanto isso, meu bebê lançava
olhares e sorrisos para ela, puro charme gratuito. A moça simplesmente não
percebia. Estava absolutamente alheia àquela pequena presença de gostosura
total. “Essa não está grávida”, logo pensei. Já meu marido, com um sorriso indisfarçável na
cabeceira da mesa: grávido. Talvez ainda grávido do próprio filho que admirava.
Existem
também aquelas pessoas que se emocionam com comerciais de fraldas descartáveis,
namoram roupas pequeniníssimas e se derretem com qualquer bebê que cruze o seu
caminho. Gente que estufa a barriga na frente do espelho. Gente que sofre
mensalmente com a menstruação que veio. Ou seja, gente grávida. Em alguns
casos, trata-se de gravidez eterna, aquela que nunca se concretizará em forma
de bebê, só Deus sabe por quê.
Mês
passado uma amiga veio me comentar com tom de novidade que estava grávida. Como
se eu não tivesse flagrado, quase um ano antes, os sorrisos dela para o meu
bebê recém-nascido. Como se eu não fosse testemunha da sua luta para emagrecer,
para preparar o primeiro lar daquele novo ser. Outra amiga rodou a baiana e literalmente
fechou as portas do seu bem sucedido negócio. Alegou precisar de mais tempo
para a família e para si mesma. Teste positivo para gravidez, tenho certeza. A
outra passou uma hora explicando como mudar as paredes de lugar caso precise
reformar o seu novo apartamento para acrescentar um cômodo, caso engravide ano
que vem. Mas que bobagem. Ela já está grávida, obviamente!
Porque
nossos passos nunca são despropositados. Porque nosso coração pulsa mais que
sangue a cada batida. Porque nossas revoluções não se limitam ao que o ultra-som
detecta.
Para Miriam, Marina e Emanuelle.