Mesmo antes de experimentá-la eu já a conhecia, assim, de ouvir falar mesmo. Minha mãe e meu pai sempre me alertaram sobre ela; meus avós, alguns amigos e até mesmo o padre na Igreja também tentaram abrir meus olhos. Mas não teve jeito, ela me pegou.
Não lembro com detalhes o primeiro contato direto que tive com a coisa... só sei que com o passar dos dias ela foi me envolvendo, tomando conta dos meus pensamentos, da minha rotina, da minha vida. Antes mesmo de o sol aparecer eu já estou em pé, com o coração acelerado na pressa de sair logo pelas ruas em busca dela. O desespero é tanto que às vezes deixo até de me alimentar, de pentear o cabelo ou de me vestir decentemente. Eu juro que por diversas vezes eu tentei, mas tentei de verdade, ficar sossegada na cama. Apertava o olho bem forte pra ver se conseguia dormir, mas ela vinha como uma voz dentro da minha cabeça, gritando pra que eu acordasse.
Já pedi ajuda aos amigos, que sempre estiveram de braços abertos pra tentar me livrar desse vício. Eles de vez em quando me buscam para um passeio, para um chope... mas em poucos minutos eu já fico inquieta, olhando pro relógio e arrumando alguma desculpa pra voltar e me entregar a ela de novo.
Em uma das minhas últimas tentativas de me livrar de uma vez por todas da maldita, fui passar uns tempos na casa dos meus avós. Confesso que a vida pacata do interiorano é contagiante; com alguns dias já estava bem mais tranqüila e desligada de qualquer coisa. Finalmente paz.
Mas a danada parece que ganhou vida própria e veio correndo atrás de mim. Quando me achou estava furiosa, avassaladora. Agora estou aqui, sentindo-a pulsar nas minhas veias, me consumindo solitária nestas quatro paredes. Mas eu tenho fé de que não vou chegar ao fundo do poço, de que essa perdição não vai me consumir.
Definitivamente a responsabilidade é uma droga!
Texto escrito dia 29 de julho de 2005, em Belo Horizonte.