Um piscar de olhos e pronto, já
havia se passado um ano. Sentei, enfim, diante do computador para selecionar as
fotos para seu primeiro álbum, que desde a saída da maternidade pensava em
montar. Tão absorvida pela vida imediata, não percebi que já acumulava na
bagagem de tão curta vida uma imensidão de memórias. É necessário diminuir os passos e olhar para
trás, contemplar o caminho percorrido para se dar conta do vivido. Vejo, agora,
quanta lembrança estes trezentos e sessenta e cinco rodopios planetários
embalaram em nossas vidas.
Você, minha criação tão esboçada,
acabou nascendo lótus em pântano de dor. Fraternamente, dividiu meu luto
consigo em tardes tristes de outono. Aceitou minhas lágrimas com a cumplicidade
de quem já compartilhou o mesmo corpo. Aninhou-se em meu seio como se pedisse
proteção, enquanto, na verdade, alicerçava-me para a vida.
Penetrou minha alma pelos olhares
graves que lançou e dos quais eu ousei não desviar. Olhares desprovidos da curiosidade típica das
crianças, embebidos de uma experiência misteriosa. Olhos do fiel profeta que
transportam a palavra divina.
Sua expressão de homem maduro,
quando pousada sobre nós, fez estremecer alguns e enfeitiçar outros. Seu avô diz que se você andasse fardado, lhe
bateriam continência. Traços fortes que
anunciam um grande homem, um super homem.
Diante de sua irmã, porém, a
imponência masculina sucumbiu. Seu rosto emanou uma luz especial, uma doçura
besta como a dos enamorados. Eu, feliz artesã, assisti o fiar deste meu manto
amoroso, cuja tessitura prossegue apesar de mim.
Doze meses abrigaram uma miríade
de riquezas cuja alquimia resultou no maior dos amores. Amor que me resgata da
inércia da vida, que me alinha com os astros celestes, que faz minha
existência romper os limites do meu corpo, que me sintoniza com Deus. Um piscar
de olhos e me tornei assim, mais humana e mais sublime. Mais materna. Mais
feliz.
Foto: Gabriela Oliveira