terça-feira, 30 de abril de 2013

Objeto Transicional


Samuel, ao contrário da irmã que já nasceu atenta para o mundo, demorou uma semana para resolver abrir os olhos. Quando finalmente o fez, lançou um olhar de descaso para as novidades que o cercavam. Frequentemente nos olhava de cenho franzido, com ar repreendedor, peculiar de um senhor que já não tem mais paciência com a humanidade ignorante.

Parece ter nascido pós-graduado em questão de vida. Passou pelas várias etapas do primeiro ano com proficiência. Aprendeu a mamar sem dificuldades, tomou as vacinas sem chorar e aceitou as consultas pediátricas com familiaridade. Passou a dormir do carrinho para o berço sem estranhamentos e do quarto dos pais para a solidão de seu recanto com segurança. Pegou hábito pela chupeta com a mesma facilidade com que o abandonou. Resolveu, porque assim o quis, parar de mamar e aceitou a mamadeira como se fosse uma velha conhecida. Não desenvolveu alergias e teve muito gosto em provar todos os sabores que chegaram ao seu alcance. Na primeira vez que foi tomar um suquinho de frutas, motamos um arsenal de câmeras e máquinas fotográficas a sua volta para registrar suas caretas. Mas, que nada. Virou uma mamadeira inteira sem pausa para recuperar o fôlego e assim foi com todos os alimentos que o oferecemos. Passamos da papinha batida para a papinha amassada e, depois, para a papinha em pedaços sem que ele parecesse perceber. Mesmo de barriga cheia ele vinha engatinhando até a mesa e, apoiado nos meus joelhos, exigia participar da ceia de gente grande. No dia em que resolvemos apresentá-lo ao canudinho, ele instantaneamente tomou um copão de laranjada enquanto nós, bobos, fazíamos biquinho para ensiná-lo a sucção. No olhar a mesma expressão de sempre dizia: “até que enfim”. E assim tive a sensação de estar sempre correndo atrás do seu desenvolvimento, disparado na minha frente.

Por essas e outras cheguei a duvidar que ele se apegaria a qualquer brinquedinho que fosse. Afinal, tais apegos funcionam como defesas às angústias da separação materna e Samuel sempre nos pareceu muito confortável com minhas ausências. Ainda assim, elegi, eu mesma, um macaquinho de tecido atoalhado para ser seu objeto transicional. Todos os dias colocava o bichinho no berço ou no carrinho de passeio. Ainda que ele estivesse dormindo, eu forjava abraços pousando sua mãozinha sobre o macaco, impondo um estreitamento de laços que jamais ocorreu.

De uns meses para cá, porém, Samuel passou a procurar pelas fraldinhas - lindamente bordadas por mãos sul mato grossenses - espalhadas pela casa para socorrer qualquer emergência desde o seu nascimento. Quando as alcança abraça-as com amor e as esfrega no rosto com energia. Quando o sono começa a chegar já me antecipo oferecendo-lhe o paninho que ele recebe com expressão de alívio. Ao reconhecer as tramas espaçadas da fralda amiga, suas pálpebras relaxam sobre os olhinhos cansados. E eu fico feliz da vida de me saber, enfim, identificada em toques delicados de algodão.




Para Marta ~

3 comentários:

  1. ooowwwnnnn que fofo....
    que adulto... que maduro... que bebê mais gostoso!!!!

    Delícia de aprendizado...

    talvez, por ser mãe de segunda viagem, vc não dê tanta importância às coisas e, consequentemente, ele tb não...

    adorei!

    beijos!

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  2. Entendi nao! Como assim Marina? O bebe ja fez um ano? Como? Cê tá falando do teu filhinho neste texto? Acho que nao, ne? outro dia cê tava grávida. Tá doida é? ora bolas, ta de brincadeira ne, Marininha?

    De qq maneira, esse menino me lembra mesmo, que só pode ter uma mae linda como vc.Porque a descricao é de um menino quase mágico... Será se ja passou todo esse tempo? e eu é que to doida? Samuel é teu filhinho?

    Gente, fiquei aqui foi suspirando, quase com inveja, meu Deus, meu filho é um chatinho pra comer. Dá vontade de arrancar os cabelos... meus, é claro... ai Marina, me dá umas dicas.

    Mas Samuel tem um incrivel bom gosto, que lindeza esses paninhos, gente.

    Como está a tua pequena depois do nascimento do bebe? Ficou enciumadinha?

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  3. Olá Marina, sou mamãe blogueira também, e gostaria de te fazer um convite, mas não achei seu email de contato no blog. Como podemos nos falar? :)

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