sexta-feira, 1 de maio de 2009

Receitas da Vovó

Quando somos crianças enxergamos as pessoas como personagens definidos que exercem uma ou outra função específica. Por exemplo: mãe é quem te ama mais do que tudo, professora é quem dá aula, avó é quem faz bolo cheiroso e quem te acolhe nas férias. Padeiro é quem faz e vende pão, motorista é quem dirige carro, irmão é quem atrapalha suas brincadeiras e assim por diante.

Lembro da primeira vez que um personagem se desfez em minha concepção. Foi quando, aos 17 anos, arrumei meu primeiro emprego como secretária em uma escola de inglês. Estar do outro lado do balcão me fez perceber que funcionários de lojas, escolas e lanchonetes são, acreditem se quiser, SERES HUMANOS! Isso foi uma grande descoberta porque até então eu não me dava ao trabalho de olhar na cara de um caixa de supermercado e nunca desconfiei que um mau atendimento poderia ser culpa de uma t.p.m. Para te ser sincera, nem sabia que essas mulheres chegavam a menstruar como as pessoas de verdade.

Depois acabei virando professora e tive vontade de ligar para todos os professores que passaram pela minha vida e confessar meus pecados. “Alô, tia Sirene! Aqui é a Nina, fui sua aluna no Jardim I em 1987. Desculpe não ter ficado no meu lugar da fila. Eu sei que eu era mais alta, mas eu queria ficar perto da Carol, minha melhor amiga baixinha. Também sei que isso não é desculpa e que você tinha seus problemas... eu devia ter facilitado as coisas pra você.” Em seguida: “Alô, professor Osvaldo? Aqui é Nina, fui sua aluna há uma década e eu queria me desculpar por ter dormido na sua aula. Na época eu não sabia, mas hoje eu sei que a matéria era interessante e que um dia eu sentiria falta deste conhecimento. Pois é, fez falta.”

Tirando essas descobertas perturbadoras que fazem a gente sentir vergonha, também existem outras deliciosas de se fazer.

Uma delas é a de que a vovó fofa e cheirosa um dia foi mulher como a gente e teve um corpo que foi objeto de desejo de um homem alto e bonito, provavelmente seu avô. Ela era linda e adorava se maquiar. Tinha as sobrancelhas arqueadas e bem desenhadas, como as de uma boneca de louça. Usava um batom vermelho que era possível se notar há kilometros de distância.(Você obviamente não se deu conta disso nas fotos porque elas são em preto e branco). Ela vestia um sutiã de ponta que resolvia o assunto como nenhum silicone consegue. Naquele dia de mil novecentos e quarenta alguma coisa ela estava especialmente deslumbrante com seus sapatos de salto e colônia. Tinha passado a noite de bob no cabelo e caprichado no blush. O motivo da super produção? Visita do Tio Joaquim, com seu neto Geraldo, um rapagão de cabelos castanhos e olhos verdes. Ela lembrava dele um tanto moleque, mas sabia através das tias que ele crescera e servia o exército. Provavelmente teria encorpado, ficado mais forte e bronzeado. Para fazer bonito, sua avó foi para a cozinha e colocou toda sua criatividade culinária em prática e fez uma torta de frango como nunca se comeu em terras brasileiras. Geraldo comeu como um cachorro faminto, trocando olhares com sua avó durante a refeição. Ele era ainda mais bonito do que ela havia imaginado. Ele aproveitava quando ela abaixava o olhar para poder espiar os seus seios (mal sabia ele do sutiã super poderoso).

Geraldo é seu avô, apesar de ser uns dez centímetros menor do que naquele almoço. Sua avó é aquela coisa fofa e materna que você ama. E a torta de frango ainda é feita, domingo após domingo e foi intitulada como a “Receita da Vovó”. E a gente desfia o frango cheia de ignorância.

Provavelmente só vamos nos dar conta inteiramente disso, da multiplicidade das pessoas, quando formos avós e estivermos vendo nossas netas brincarem de princesa com a camisola que usamos na nossa noite de núpcias ou coisa assim.

5 comentários:

  1. Ai, que vontade me deu de ter uma avó pra cozinhar gostoso assim *.*
    Vovó Lourdes até faz alguns doces de vez em qdo, mas nem sou fã de does em geral. Minha outra avó já não cozinha mais... AMAVA o frango com quiabo dela *.*
    E sabe, se redmir dos erros que cometemos ao longo da vida é bem difícil, mas um dia a gente chega lá.
    Amei seu post anterior! Tudo que eu mais preciso agora é de um amigo gay, viu!
    Beijos, prima!

    PS: Não esqueci seu email, tô perdida com o monte de coisas da facul que tenho pra ler/fazer... sabe cumé :B

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  2. ops, doces*.
    e ah, pra facilitar, meu brogue: http://carolda.blogspot.com ;D

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  3. Oi, Nina!

    Teu blogue é especial!

    Obrigado pela visita lá no meu, viu?

    Beijo grande!

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  4. É, Nina... receita de vó é o que há! EU, por exemplo, só comia feijão da minha falecida avó e AMAVA o frango cozindo dela (ela se foi no ano passado, mas já fazia um tempo que não cozinhava por causa da doença). A minha outra vozinha e madrinha não cozinha mais como antigamente tbm... assim como a outra, NHOQUE era só dela! Mas ela ficou meiosem gracinha pra fazer comida.
    Essas coisas fazem falta! rs

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  5. O pior de tudo eh que todos os professores, pelo menos os meus, sempre falaram que agente ia precisar daquela materia, mesmo que fosse o estudo do sistema digestivo das anemonas do mar.

    Saudade da minha vozinha...

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